domingo, 28 de dezembro de 2008

Só pra avisar.

Esses dias eu publiquei todos os rascunhos que eu estava esperando organizar, porque eu cansei e já tinha esquecido qual era a ordem e o caralho.
Então publiquei tudo de uma vez.
Não, não estão na ordem. Estão soltos e se alguém se interessar em ler, muito obrigado.
Se não, foda-se também.
De qualquer forma, sai dessa internet e vai fazer sexo. É mais proveitoso.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A Dama da Noite.

Parece que entramos numa fase de analisar adaptações, né? Não que eu esteja reclamando... Tá, estou, mas só por puro esporte. Não é algo para ser levado a sério.
Analisar adaptações de textos que eu conheço (e gosto) é difícil porque eu busco alguma semelhança com o original. Eu quero que o novo autor tenha capturado pelo menos um pouco do "feeling" que o original tinha. Se ele conseguir ultrapassar isso e criar uma obra pessoal a partir do texto, melhor ainda.
Dito isso vamos falar do curta A dama da noite, com Gilberto Gawronski e dirigido por Mário Diamante, baseado no texto homônimo de Caio Fernando Abreu.
Vou começar com uma pergunta , e ela vai fazer mais sentido para quem já conhece o texto: Por que diabos todo mundo caracteriza a "dama" como um homem travestido? Sério, acho que isso ultrapassa o âmbito do texto e entra no fetiche pessoal do realizador. Eu já vi mais de uma adaptação desse texto feito dessa forma e nenhuma chegou ao ponto do texto, nem jogou uma nova luz sobre o original. Sempre se resumiu a uma bichice exagerada.
Talvez porque o personagem do travesti, como nós (classe média apavorada) o conhecemos e caracterizamos, seja algo fraco para conceber a cria de Caio Fernando. O personagem do conto é um simulacro, fato. Mas é um simulacro que demonstra lampejos de humanidade e sentimento crus, por vezes excessivamente bregas. É o contrapeso emocional que seus personagens encontram para tornar suas vidas suportáveis.
Eu sempre vi o personagem do conto como mulher. Talvez porque eu nunca tenha encontrado um travesti que me mostrasse, em cena, um oco emocional daquele nível. São cruezas encobertas de esperanças. E o ator não faz isso.
Sem contar que o fato de todo o texto do conto se resumir a uma performance de drag queen não ajuda, né? E quero dizer isso literalmente, a trama se desenrola assim.
Tem gente que gosta de coisas bem construídas, estruturadas. A mim, elas não incomodam, são até prazerosas de se ver. Mas sem sangue, sem vida interna, não valem o meu tempo. É assim que o filme aparece: Tudo faz todo o sentido. Quase nada vaza. E é só bichice.
A maior parte dele.
Existem dois momentos pelos quais vale a pena assistir o curta. O primeiro é uma interrupção no monólogo do protagonista por uma garota. E isso dá uma pontada naquele lugar do seu peito onde você não lembrava que tinha guardado aquela ânsia mal resolvida. Aquela mesma.
E o outro momento é o final. Ah, que momento delicado e cortante. Talvez porque não tenha sido tirado do A Dama da noite e sim de Harriett, outro conto de Caio Fernando Abreu. Diga-se de passagem, fiquei morrendo de vontade de ler esse conto. Talvez o diretor devesse ter feito um curta desse último. Ele captou melhor o cerne da coisa e ainda deu um toque pessoal.
Ah, acabei de ler o conto. E é lindo.
Acho que não tenho como concluir isso aqui bem. Me veio aquela dor que ataca vezenquando.

Ainda é dezembro.

Eu já falei, em algumas resenhas sobre o festival de Curitiba, de adaptações. Adaptações de filmes, adaptações de livros, de poemas. O problema de transferir uma mensagem de um canal de comunicação para outro são todos os empecilhos que faziam algo valer a pena ser lido, por exemplo, não valer o celulóide no qual foi filmada sua adaptação. E vice-versa.
Isso acontece especialmente com narrativas no qual a ação é interna, como Clarice Lispector ou Virginia Woolf. A opção mais frequentemente usada é uma narração em off que destrói completamente o motivo por trás de uma adaptação. Eu penso : Pra quê você está lendo o livro pra mim? Tenho cara de analfabeto?
O conflito entre os meios usados para passar a mensagem e a superação deles é o que produz uma obra interessante. Eu não quero ver uma leitura, eu quero que o autor da adaptação insira sua marca pessoal na sua obra, sem perder de vista a original. Em alguns sentidos, é mais difícil fazer uma adaptação do que começar algo do zero. De certa forma é trabalhar uma obra do zero mas mesmo assim ter por trás uma série de parâmetros pelos quais se guiar. Só que se enveredarmos por esse caminho vamos entrar numa discussão retórica infinita, e eu não sou grande fã de masturbação teórica.
Fui assistir "Ainda é Dezembro", peça baseada nos textos de Virgina Woolf. Assistir teatro em Natal sempre me incomoda por causa do simbolismo vazio. Mas, confiando nas cabeças pensantes por trás do processo, fui lá.
Na entrada, a platéia foi dividida em duas. Ao passar por um túnel feito de pequenos praticáveis de madeira (experiência claustrofóbica), metade da platéia sentaria em volta de onde se daria a encenação e a outra metade ficaria no túnel. Como eu não pude ficar no túnel, só ouvi o momento inicial da peça, que foi apresentado num local onde apenas as pessoas que ficaram presas poderiam ver.
A experiência sinestésica diferenciada e o uso de elementos sensoriais ao invés de simbólicos demonstra uma noção muito boa do texto com que estão lidando: As coisas não simbolizam por si só, elas têm que significar algo, e isso tem que ser passado para o público. Essa experiência de sentir o desconhecido ao adentrar o túnel (ok, ok, sem piadas aqui) me inseriu naquele universo: O universo de Virginia Woolf, onde as coisas existem e se apresentam para mim antes que eu possa nomeá-las. O mundo é arbitrário, fugaz e inominável, e nossa vida, frágil. Nessa entrada eu senti o que quer dizer "Viver, por um dia que seja, é algo muito perigoso."
Durante a peça, os momentos que mais me tocaram foram aqueles nos quais as palavras não eram usadas. Eu tive certas epifanias, e um espetáculo ser capaz de fazer isso já é algo incrível. A mais forte ocorreu durante os momentos em que as atrizes se tocavam no centro do palco. A energia que elas construíam, as imagens, o que aquilo passava para mim era equivalente a ler algo de Virgina Woolf: Eu vi o vazio da vida, dos corpos, das emoções. Esse vazio que nos leva a fazer contato com outras pessoas. O vazio que tem sede.
E, em Virginia Woolf, isso alcança um caráter de homossexualidade. Não vai além do sexual em busca de um mero toque de um corpo no outro (que às vezes pode significar muito), mas passa por uma definição muito clara de gênero: O homossexualismo feminino, não como uma inversão de papéis e repetição de pólos positivo\negativo, ativo\passivo ou masculino\feminino, como tanto se advoga em certas teorias, mas o homossexualismo feminino como encontro de seres que são massas de desejo. O feminino como vazio que busca algo para preenchê-lo, que busca nome para seu amor. Não sei se gênero está irrevogavelmente gravado em nossos corpos, mas essa noção é algo que eu nunca poderia ter de outro modo que não fosse assistindo essa peça. Eu vi como o feminino se coloca no mundo, eu vi desejos afiados como lascas de osso (para citar As Horas) dançando e se entrecortando para encontrar algo. É uma entrega, um desapego e um amor que eu nunca conseguiria ter enxergado de outra forma.
Sim, existem problemas técnicos na peça, existem momentos que podem melhorar em qualidade para refletir outras características dos textos de Virginia Woolf, como por exemplo o movimento das ondas do mar. É um espetáculo que, na minha opinião, está em fase inicial de desenvolvimento. Ainda tem muito para desabrochar.
Mas isso é um detalhe. O importante é que há uma semente. E com isso se pode fazer qualquer coisa.

domingo, 13 de abril de 2008

Manifesto Ciborgue.

"Aqui é onde Kafka se encontra com Michael Jackson." Audacioso. Prepotente, até. Eu gosto disso. Uma chamada bem feita me leva a ver espetáculos dos mais horríveis.
Não que esse seja o caso aqui.
Mas, infelizmente, esse espetáculo também não cumpre o que promete.
Espetáculo feito de imagens. Ok. A explicação do diretor nem me incomodou tanto. Aí seguimos uma trajetória de símbolos que trazem uma carga de significado para o espectador que é até interessante. Eu ri um bocado. Alguns momentos, como o poema citado perto do fim ou quando o rosto aparece coberto com massa de pão até que ficaram em minha mente. Mas só. O instante mais profundo da peça foram aqueles em que os atores se distanciam de suas partituras e falam poemas. Não foi só pela beleza do texto, mas pela carga que era dada pelos atores. Era como se fosse um poema escrito por eles, ou pelo menos houvesse tocado fundo em algum ponto da pessoa (não do personagem) e eles conseguissem exprimir isso.
Isso foi belo. O resto, com o perdão do termo, foi kitsch. Muito referencial. Os símbolos eram usados sem sua profundidade necessária. Era como se ele buscasse o máximo de reconhecimento possível, simplificasse a coisa tirando sua profundidade ao invés de emaranhado de relações que se constrói em volta de um ícone. Você tinha que conhecer o que ele estava mostrando. Mas só. Comparar Frankenstein com Michael Jackson? Já vi isso antes, e muito mais bem feito.
O diretor parece só ter amarrado uma série de ícones, sem se preocupar muito com uma possível relevância dos mesmos. Eu vou ao teatro por um motivo. E é para sentir mais do que eu sinto ao ficar mudando de canal em casa. A peça me deixou essa impressão no final: Foi como se eu tivesse passado por uns 40 canais, encontrado algumas pérolas na TVU ou no Corujão da Globo, mas o sinal dava interferência e eu tinha que voltar para a MTV no momento em que passam clipes antigos ruins. Ruins e chatos.

sábado, 5 de abril de 2008

Mais Críticas do festival de Curitiba.

(OK, estou colocando esse balaio em ordem. Com sorte eu consigo tirar isso do sistema antes de ir para a FENART e ver mais peças.)

Dia 22/03
2ª peça: Scarrol: Da trilogia da duquesa à queda da rainha.
Do Grupo Heliogábalus
Alice no País das Maravilhas e Alice Através do Espelho. Parece que todo grupo de teatro já fez uma adaptação, uma releitura, uma citação que seja, de uma dessas duas obras de Lewis Carrol (ou das duas). E sempre fica parecido, a não ser que o grupo coloque novos ingredientes na mistura como o grupo Armazém fez. Mas para inserir novos ingredientes numa gororoba como Lewis Carrol é necessária pelo menos uma estrutura básica no sentido financeiro, já que representar o tema surreal de Alice literalmente seria pobre, ou no mínimo limitado*, e imergir o espectador exige uma dose considerável de efeitos cênicos (que custam $$$) sem falar em elementos performáticos para acrescentar realidade à teatralidade.
Se for para escolher um dos dois, fique com a performance e jogue o dinheiro fora (digo, pague os atores).
Os efeitos cênicos, caros ou baratos, serviriam para aprofundar a platéia no espetáculo, ou seja, seu efeito seria performativo. E profundidade é a proposta do Grupo Heliogábalus que, em Scarrol, segue fielmente a origem artaudiana do seu nome. Isso é feito com performances.
A escolha do local colabora. A Casa Vermelha oferece um leque de possibilidades que não o palco frontal. As cenas descem as escadas, aparecem atrás do público, ocorrem no segundo andar enquanto estamos no primeiro. Como algumas cenas são simultâneas, não sabemos onde será a próxima nem se irá envolver a nós, o público. Isso nos deixa nervosos. E isso para mim é teatro.
Com a apresentação inicial dada pelo Gato de Cheshire (pelo menos eu acho que era ele, com aquele sorriso macabro) o tom da peça fica claro: A crueldade presente em Alice, incluindo o tom sexual. Poderia ser só um show de horrores ou uma tentativa de chocar o público tornando explícita a sexualidade que é apenas subtexto na obra original. Mas é muito mais que isso.
Um texto que entra em conflito com as imagens formadas, o público levado a interagir com os atores e o cenário, momentos genuínos de tensão graças à expectativa que é construída em nós. Tudo o que Artaud queria. O grupo Heliogábalus transforma Alice em peste e terror. E dessa forma os problemas técnicos tornam-se irrelevantes (houve algum?) já que estamos tão tomados pela energia da encenação. Não, nem todos vão gostar. Sim, isso é teatro de verdade. Teatro que angustia, morde nosso coração e cospe fora. Sim, isso vale a pena milhares de quilômetros percorridos e dores nas costas decorrentes da viagem. Isso é arte. Arte bem feita.


*Não que necessariamente VÁ ser pobre. Mas em matéria de teatro já vi textos lindos serem transformados em lixo e textos horríveis virarem pedras preciosas. Por isso, quando se fala em teatro, eu só acredito vendo.

sexta-feira, 4 de abril de 2008

As três irmãs.

Anton Tchekov é tido como um pilar na dramaturgia moderna. Esse escritor de contos e peças russo se esmera em mostrar o máximo possível do mundo interior de seus personagens com o mínimo de ações externas possível. É como cada personagem tivesse dentro de si um mundo subterrâneo a ser descoberto através de suas pequenas ações cotidianas.
Na montagem de "As Três Irmãs", de Tchekov, a primeira coisa que as atrizes fizeram foi interagir com o público. Estávamos na sala de espera quando as atrizes saem do teatro e falam conosco, nos dando balões e falando pra enchê-los mas não amarrar a ponta. Entramos no teatro e outra atriz está nos esperando. Devemos soltar os balões no momento que ela entrar em cena, para causar um "efeito especial".
Esse é o tom de interação que percorre toda a peça. Alguns de nós são chamados a entrar em cena para uma festa, outros são referidos como "o sargento" ou "nosso irmão Andrei" (eu fui esse último). O problema da existência de vários personagens na peça original é resolvido através da adaptação do texto e da transferência desse papel para o público. Isso não causa estranheza em nós, pelo contrário, permite que acreditemos na vida que se passa ali na nossa frente e é apenas contada pelos personagens ao invés de mostrada detalhadamente. Um dos problemas do teatro, na minha opinião, está no mostre-e-conte. Quando você vai lá na frente e recita algo. Isso me dá sono. Eu quero ver coisas em movimento (ou não, como em Beckett). Eu quero ver pulso. E essa encenação, com um texto clássico e técnicas de clown aplicadas a ele, me deu isso. Pulso. Vida.
Era o clown em sua forma mais elementar: a da crueldade. A da dor da impotência. Um dos personagens não tinha antebraços e outra era muito feia. A vida é mostrada em seus detalhes (o texto de Tchekov permite isso) e a interpretação nos faz sentir aqueles detalhes. A sensação que me acompanhou durante a peça foi a de que eu queria que a peça acabasse. Porque eu estava sofrendo junto com as garotas e não conseguia parar. Aquela vida que se estendia sem objetivo à minha frente era angustiante. Incrivelmente angustiante. E chegou a um ponto alto para mim quando a atriz, em um momento de tensão, chegou até uma espectadora e disse "Me joga?" Quando a moça não entendeu, a atriz explicou "Me joga fora?"
Essas e outras dores foram o que a Cia. Traço de teatro me proporcionou. Dores da presença. Dores de existir no mesmo espaço que as atrizes. Eu dividi a casa, a vida, e até o sangue (sendo o irmão Andrei, que perdeu tudo no jogo) com elas. Eu não assisti apenas. Elas me fizeram viver algo único e irrepetível. Uma outra vida. Com todas as implicações possíveis dessa palavra.
E foi maravilhoso.

sábado, 29 de março de 2008

Laranja Mecânica.

Todos viram o filme (ou quase todos). Alguns poucos acabaram lendo o livro também. E aqui aparece a peça. Laranja Mecânica. O clássico que de onde saem centenas de referências desde o nome bandas obscuras até trechos de "Os Simpsons".

E como seria uma peça de Laranja Mecânica? O diretor pega o mais óbvio: uma escolha brechtiana, o que significa narrações dos personagens das situações e sentimentos, feita na peça através de dois microfones localizados um em cada canto do palco. Não que não seja apropriado para a história do jovem Alex uma forma de representação que aproxime e distancie o espectador em sucessão para que ele possa tanto se sentir dentro da história quanto possa ver de fora o estrago que está sendo causado pelo protagonista.

Mas na prática não é isso que ocorre.

Como a peça toda vai se desenvolver nos é mostrado no início. Nenhum problema até aí, já que é interessante que nos seja dado algo para nos ser retirado depois, nos fazendo sentir um sentimento de impotência próximo do de Alex. Mas eu não senti nada. Nem pena, nem vontade de ajudá-lo. Eu fiquei agitado com a energia forte do início da peça, com o rock pesado que saía das caixas, das movimentações dinâmicas personagens promovendo ultraviolência. E depois cansei. Não era mais interessante. A peça me dessensibilizou, me acostumou a um nível alto de energia e não me deu mais nada. O que se seguiu foi apenas uma série de tentativas de piedade ou comédia negra. Mas não passaram de tentativas. Nada mais me tocava. Eu adormeci perto do fim do primeiro ato, e depois do intervalo (desnecessário), voltei à história. Aí Alex se torna uma Laranja Mecânica, fica indefeso e todos nós conhecemos a história. Mas eu não me senti indefeso como o Alex, ou pensando em seu triste destino. Eu não ligava, não me despertava empatia, compaixão ou um mínimo de semelhança. Nada.

A peça, como saldo final, me deu alguns momentos de adrenalina e um personagem hilário, que era a mãe do alex (O vestido dela é impagável). De resto, não vale dez reais nem uma hora e quarenta da sua vida. Se você quer uma sugestão, assista o filme. Ou leia o livro. Ou vá até matar velhinhas na rua, mas não se dêem ao trabalho de ver, ou pior, encenar peças como essa.

Buk na rua : Teatro noturno para adultos insones.

Dessa eu só vi o final do último esquete (eram 4). Mas pelo pouquíssimo que eu vi, era mais uma adaptação ruim à la "Mínimos Múltiplos Comuns", com gente lendo texto e interpretando o que foi lido. Ou pior, já que Bukowski é narrativo. Não haveria a necessidade disso como em Noll.

Mas no fim das contas eu não vi a peça e não posso opinar.

Boa noite, meus senhores.

Deserto (Mostra de Processo)

Arte contemporânea não é minha praia. Não era, na verdade, até um tempo atrás. Isso foi até eu descobrir que existe uma diferença entre arte contemporânea e masturbação mental. Nesse processo, amadureci e também vi que nem tudo se expressa com coerência, e que existem certos canais de expressão que não são verbais.

Mas ainda acho que tem arte contemporânea, especialmente na área de artes plásticas, que é masturbação mental. Se você vai fazer algo pra você, fica em casa, não expõe numa galeria ou vai prum teatro. A não ser que essa seja a sua proposta. Mas eu não preciso gostar da sua proposta.

Coisas como "Work in Progress", "Arte Conceitual", "Resignificação de Conceito" dá margem a muita coisa ruim. E muita coisa boa também, é fato. Mas produzir algo bom é difícil em qualquer área. E fazer coisas ruins é fácil.

Fui para essa mostra de processo, na qual o diretor explicou os objetivos e os rumos do projeto e o que aconteceria ali naquela noite. Não era um ensaio aberto. Era uma exposição de como um ensaio se desenrola para eles, como funciona um dia de trabalho. Que técnicas, que exercícios eles usam, nesse estágio inicial, para moldar os personagens e as situações.

Parece meio chato, do jeito que eu falo.

Foi ótimo.

Não sei se é porque eu faço teatro, mas foi muito bom ver aquele processo. Era natural. O diretor dava as intruções para os atores, eles às vezes chegavam a criar cenas, que no próximo minuto eram descartadas ou eram apenas um método de se chegar a um estado para aí sim construir a cena. E todas as cenas eram interessantes. Os exercícios que víamos os atores fazendo eram interessantes. Eles estavam à vontade, na maior parte do tempo.

O que víamos chamava a atenção. Ver a obra tomando forma era bonito.

E depois houve um diálogo com os atores. Os comentários de algumas pessoas valeu a pena. O de outras me deu vontade de puxar um revólver, mas isso não importa para a aobra em si. Foi uma experiência muito boa.


Vou tentar assistir a peça quando estrear.

sexta-feira, 28 de março de 2008

Prova Contrária.



Existem vários tipos de teatro. O mais conhecido e difundido é o Teatro Ruim, perto do seu companheiro, Teatro Cretino. Mas como eu não me aventuro nesse último (que inclui peças como Cinderela: A história que a sua mãe não contou) eu acabo assistindo, em sua maioria, Teatro Ruim.


Não que eu seja arrogante, porque nada do que eu fiz em teatro até agora eu acho bom. Eu sou é chato.


Enfim, o Teatro Ruim tem várias vertentes, entre elas o teatro adaptado de romances. Especialmente quando o romance envolve descrições mirabolantes e o grupo tem que usar o distanciamento do teatro épico (onde o ator narra a história) para suprir sua falta de recursos ou criatividade. Ou ambos.


E a outra possibilidade do romance ou conto é quando este envolve dois personagens falando do passado em um cômodo simples. Oa dramaturgos( incrível chamar isso de dramaturgo, mas enfim...) acham que é só colocar os dois nesse cômodo de frente para a plátéia e fazê-los falar as mesmas coisas do livro. Ô anta. Na literatura a palavra escrita tem um dinamismo diferente. Fazer isso é como fazer um flashback no cinema. Na verdade, isso pode até funcionar, dependendo de uma conjunção de fatores, como o ator, a direção, etc. Porque eu acho que em teatro tudo pode ficar muito bom e tudo pode ficar muito ruim.



Após essa longa reclamação inútil, vamos falar da peça. Baseada no romance do escritor Fernando Bonassi (que já trabalhou com o Teatro da Vertigem), ela fala sobre uma mulher cujo marido desapareceu na época da ditadura e em 1994 (se não me engano) recebe uma indenização da Anistia ou coisa parecida. Com o dinheiro ela compra uma casa e quando está prestes a abrir o champanhe para comemorar a compra da casa e, por tabela, o desaparecimento do marido, ele aparece na porta. Premissa interessante, né? E o cartaz, como dá pra ver ali em cima, é bem interessante também, faz alusão ao título, à presença fantasmagórica do marido, etc.


Eu entro na peça. A atriz que interpreta a protagonista é alemã. Na verdade, a peça é originária de lá. Isso me empolgou. Até eu ouvir o sotaque desgraçadamente horrível da mulher. Parecia que estavam arranhando a parte interna do meu crânio com um garfo. Mas quando o marido entrou eu me empolguei novamente. A caracterização dele estava muito melhor que a dela. As olheiras, o porte de exilado. O olhar morto que ainda tem um pouco de ódio guardado no fundo. Aí eles começaram a dialogar sobre o que aconteceu.


E eu dormi por uma hora.


Quando acordei, eles ainda estavam dialogando sobre o que aconteceu. E ainda faltava meia hora de peça.


Então, acredito que como crítica isso aqui não vale muito, já que eu vi apenas um terço da peça. Ou talvez esse critério seja importante. Peças que fazem você dormir e quando se acorda você sente que não perdeu nada não valem a pena.

O pior foi o texto. O que eu ouvia era tão bom. A força do texto escrito era genial. Mas não foi (nem nunca é) o suficiente para sustentar um teatro, uma representação dele. O texto tem que estimular os atores para que eles criem uma leitura própria. Imagens próprias. Para que correlacionem o texto com outras coisas e criem vida no palco.

Isso não foi vida. Foi uma hora de sono e meia hora de tédio. Com um sotaque irritante o tempo todo. Não me surpreenderia se eu tivesse sonhado com o sotaque enquanto eu dormi, mas graças ao bom Deus, não foi o caso.

Se forem fazer uma leitura dramática, anunciem como tal. Mas não me digam que eu vou ver teatro. Uma hora e meia é tempo demais. E eu podia estar vendo uma peça do Caio Fernando Abreu.

Gerald Thomas: Terra em trânsito.

Ok. Depois de Scarroll, eu estava razoavelmente impactado pelo poder que a performance tem de me causar sensações desconhecidas. Assisti Dr. Qorpo e embora tenha gostado, no momento em que a peça falha na dramaturgia e me transforma em espectador de personagens, eu de certa forma pensei cá com meus botões que teatro frontal, por melhor que seja o texto (existem monstros do nível de Harold Pinter e Sarah Kane), não fica tão bom encenado. Porque nada aprofunda você tão bem na experiência teatral quanto a performance.


E cá estou eu, fazendo meus julgamentos apressados de novo para ter minhas pernas quebradas no instante seguinte. Será que eu nunca aprendo?


Vamos eu e João ao fim do mundo assistir Gerald Thomas. O teatro era longe pra caralho. Eu lembro que ao ver um vídeo da peça eu fiquei meio cansado. Me parecia uma série de referências colocadas juntas para dizer "oh, como sou culto". Mas vamos lá.


A peça começa interagindo com você, graças ao humor. O texto realmente não tem limitações de pudor, e fala sobre o que quer da forma que quer. O primeiro personagem que fala na peça é Paulo Francis, através do rádio. Fazendo comentários nazistas.


A naturalidade com que os personagens interagem, a Fabi e o Ganso (um ganso de meia), falando sobre assuntos aparentemente díspares, mas no fundo conectados (como vemos no final), a Fabi surtando com a cocaína, com as roupas, com o ganso. Tudo funciona perfeitamente e nos dá uma sensação de imersão profunda enquanto estamos sentados nas cadeiras.


Não há muito mais o que falar, já que a peça se constitui primariamente de um diálogo entre os dois personagens (o que remete a Beckett e suas peças baseadas no diálogo eu/outro). O diálogo é crível. E profundo. E nos desperta em termos não apenas intelectuais. Nós acreditamos naquele ganso tosco feito de meia. Não me pergunte como. Mas acreditamos.


E acreditamos num revólver cenógráfico fake. E outras coisas claramente falsas. Mas é só o símbolo. É só o signo que o teatro mostra, apoiado pelo texto e pela presença dos atores, que nos move. O teatro não precisa mostrar fielmente como o cinema. Ele precisa fazer você acreditar. Gerald Thomas entendeu essa tradição do Teatro. E a usa com maestria. Ele é um monstro do teatro. Me mostrou que apesar de de cada um de nós ter afinidades com isso ou aquilo, qualquer teatro, qualquer arte, pode te tocar de uma forma que você não esperava. Eu saí do teatro atônito, com um frio no peito. Uma angústia delicada.


E ainda não entendo por quê.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Jozú, o encantador de ratos

Eu achei que depois de A Gênese Ordinária, mais nada em teatro aqui no festival significaria muito para mim. O Festival teve altos e baixos, mas depois de Catástrofe (de Borboleta) ontem, e depois que A Gaivota (Alguns Rascunhos) do Piolim não me tocou tanto, achei que tinha chegado ao ápice possível nesse festival. Que depois disso nada mais em teatro me tocaria do mesmo jeito.


Mas aí me aparece isso.


Jozú.


O encantador de ratos. De Hilda Hilst


Mas que texto filho da mãe.



Pra quem não sabe quem é Hilda Hilst (como se muita gente lesse isso aqui, né?),ela é uma escritora do porte de Clarice Lispector. Genial. Profunda. Complexa.


E muito, mas muito debochada.


O texto da peça é baseado numa ficção dela "O pequeno grande Jozú", que é um conto primoroso. Como são os textos da maturidade da Hilda.


Aí eu entro no teatro. Passo por cima de uns galhos e sento na cadeira.


A cena é composta por uma caixa, uma bengala fincada num vaso, uma escada de corda que vai para o alto, dois espelhos de corpo inteiro rachados, uma lâmpada e um local para se colocar um lampião. E um cocô no chão.


E é com esse cocô que o texto começa. Sem ânsias metafísicas. Com a questão de quem foi que cagou no poço em que Jozú vive.


Depois vêm as relações de Jozú com os dois outros personagens, Gozuel e Jozuelda, que passam o dia "metendo" e só depois que acabam alimentam Jozú.


Jozú é um encantador de ratos. Ele treina ratos e os faz dar saltos mortais. Esse rato já é o seu terceiro.


A atriz, Carla Tausz, interpreta todos os personagens que interagem com Jozú, assim como o próprio, por isso, não sabemos se esses personagens realmente existem. Mas a atriz, ao invés de brincar de teatro fazendo personagens claramente verossímeis e distinguíveis ou nos colocar um delírio claro na frente, nos põe dentro do delírio do próprio Jozú. É ele falando com ele mesmo. E conosco. Nos sentimos também personagem da história que ele conta, graças à interação que é feita com a platéia e da mesma forma com os personagens que não se encontram de corpo presente no palco. Esse é um dos pulos do gato da encenação.


E foi o que mais me levou a me identificar com Jozú, como os textos da Hilda já fizeram tantas e tantas vezes comigo.


Cada vez que ela passava na minha frente, e olhava nos meus olhos, eu tinha a sensação de ser um personagem da imaginação dela. E isso é muito estranho. E dói. A relação eu/outro, o meu ego se dissolveu naquela peça. Uma peça maravilhosa encenada com texto pronto, sem inserção visível dos atores (nesse caso, da atriz) sobre o texto.


Ela encarnou Jozú. Ela encarnou um pedaço da Hilda.


Eu encarnei os dois e fiquei me perguntando se também não estou num poço fundo, treinando ratos e construindo meu mundo assim. A partir de dejetos.

quarta-feira, 26 de março de 2008

A Gênese Ordinária.

Como começo falando desse espetáculo que me deixou sem fôlego? Pela sinopse eu não dava muita coisa. Sabe como é, esse cinismo moderno, especialmente em relação ao teatro. Todo mundo acha que ser ator é só subir no palco e ler um texto (o que às vezes funciona). Mas na entrada da peça Amélia (tosca, por sinal) me deram o folder. E lá tinha escrito: Artaud/Grotowski. Quem não conhece Artaud nem Grotowski, eu poderia mandar à merda. Mas como sou um cara legal (e como tenho consciência da minha ignorância. Fazem mais de 8 meses que eu não vejo TV) vou postar uns links lá embaixo.

Voltando ao assunto.
Primeiro pensamento: Será que esse cretino não sabe que Grotowski não bebeu da fonte de Artaud e sim da de Stanislavski e seu método de treinamento para o ator?

Segundo pensamento: Como seria um bom espetáculo com base em Artaud e Grotowski?

Terceiro pensamento: A crítica compara esse cara (Antônio Mello) a Jeff Weiss. Mas quem porra é Jeff Weiss?

Enfim, resumo da história, eu acordei cedo (e pra quem passa o dia caminhando com uma mochila nas costas pela cidade de Curitiba, fumando, 8:00 da manhã é cedo) e fui ver a peça às 12:00.


O que foi aquilo? Minha Santa Madre Igreja.

Eu entrei no teatro, me sentei na frente do palco e a peça começou. Primeiro, tocou uma música que eu não reconheci e o ator atravessou o palco com um bastão amarrado às costas. Ok, belo domínio do corpo, ele realmente parece que está numa corda bamba.

As luzes se acendem. É isso?

As luzes se apagam novamente e a cena se repete para o outro lado.

As luzes se acendem.

Ok, ok, eu conheço teatro conceitual, mas isso é piada comigo, né?

Pela terceira vez, a cena.

Mas que porra é essa? Houve algum problema nos bastidores? O ator está tirando uma com a nossa cara?

Aí ele quebra nossas pernas. Filho da puta.


O que se segue são orações, impropérios, engulhos, sagrações, pedidos feitos de joelhos, palavrões, bençãos, hóstias e cus.

Isso mesmo. Cus. Cu no plural.


E é lindo.

E a música? Quando começa a tocar, perto do final, "CABEÇA, CABEÇA, CABEÇA DINOSSAURO"?


Esse cara me violentou, me bateu, me acariciou, me beijou na boca, me cuspiu hóstia mastigada na cara. Sem me tocar.

Praticamente sem sair do foco de luz central do palco.


Eu não sei muito mais o que falar, exceto que quando acabou, eu não me lembro da útlima vez que eu bati palmas tão fortes. Quando levantei para aplaudir, tudo estava diferente. Leve. Estranho. Minha cabeça girava. Senti meu coração batendo. Coloquei a mão no pescoço. Taquicardia.


Meu Deus do Céu.


Como. Ele. Fez. Isso.



Eu não sei. Mas eu adorei.







*Links Sobre Artaud:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonin_Artaud (Sim, eu uso a wikipédia. E gosto. E ninguém tem nada a ver com isso.)
http://www.triplov.com/surreal/artaud_willer.html
E sobre grotowski:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jerzy_Grotowski (Wikipédia de novo aí.)
http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_2471.html

Críticas do festival de Curitiba. Em ordem cronológica.

(Não que muita gente vá ler, mas serve, no mínimo, de experiência de escrita para mim. E serve também para as pessoas que visitam isso aqui. Então lá vai. Ah, e em doses homeópáticas, ok?)

Dia 21/03
1ª peça: Coçando o Saccro
Do grupo Olaria Grandes Bosta
Lembre-se de Hermes e Renato. Agora imagine isso no teatro. Imagine que eles têm um texto mais afiado, mais inteligente, com piadas mais elaboradas, mas com as mesmas risadas forçadas. Pronto, aí está o Olaria Grandes Bosta. Dá pra se segurar um pouco no começo, se dizendo "que merda, eu faço esse tipo de piada com meus amigos". Mas essa é a graça! Como Hermes e Renato. Você se identifica com os pseudo-atores porque você (não eu, eu sou um estudante de teatro. Ok, a quem estou enganando?) também é um pseudo-ator enrustido e se tivesse colhões subiria naquele palco e faria as mesmas piadas sem graça. Por isso você ri. E por isso é ótimo. E vale a pena. Teatro amador da melhor qualidade. Amador, mas melhor do que certas coisas profissionais que eu andei vendo por aqui.